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Thursday 3 January 2013

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 Quando falamos em monstros icónicos da história do cinema um dos seres que nos vem logo à cabeça é o temível Godzilla, uma espécie de dinossauro gigante que representa o medo da ameaça nuclear que ainda estava muito viva na sociedade japonesa, e arriscamos a dizer, a nível Mundial, aquando do lançamento do filme. Lançado originalmente a 3 de Novembro de 1954, "Godzilla" foi um sucesso junto do público, tendo iniciado uma franquia de sucesso que contou com vinte e oito filmes produzidos pela Toho Studios, um remake norte-americano, séries de animação, jogos de computador, brinquedos, entre vários outros elementos. Fruto da radiação provocada pela bomba atómica, Godzilla simboliza o receio japonês em relação a estas armas que dizimaram Hiroshima e Nagasaki, após o ataque norte-americano no final da II Guerra Mundial, bem como ao célebre episódio do Lucky Dragon 5, um navio de pesca japonês que foi contaminado por um teste nuclear norte-americano que correu da pior forma, com a bomba Castle Bravo a desencadear uma explosão de 15 megatons, tendo contaminado os tripulantes desse navio, bem como territórios das proximidades.
 Durante o processo de criação de Godzilla, estávamos em plena Guerra Fria, um período onde o receio em relação à utilização da bomba nuclear e os seus efeitos devastadores pairavam um pouco por todo o Mundo, enquanto Estados Unidos da América e União Soviética procuravam desenvolver ao máximo a sua tecnologia, em particular a militar, na "paz armada" que envolvia as duas potências da época. Diga-se que este receio não é exclusivo japonês, ou não tivessem os criadores de "Godzilla" também tirado imaginação de filmes como "The Beast From 20,000 Fathoms", de Eugène Lourié, que exploravam a temática dos monstros e do receio em relação à ameaça da bomba atómica.
 Realizado por Ishirō Honda, um cineasta que ficou bastante ligado à saga por ter realizado filmes como "King Kong vs. Godzilla" (1962), "Mothra vs. Godzilla" (1964), "Destroy All Monsters" (1968), "All Monsters Attack" (1969), entre outros, "Godzilla" marca o início de uma franquia de sucesso que tem no trabalho do cineasta um importante contributo para o fenómeno em volta deste monstro destruidor que é Godzilla, ao desenvolver uma obra que hoje em dia surge algo datada, mas tem uma relevância significativa para a história do cinema. Como realizador do primeiro filme da saga, Honda teve um papel de relevo na criação do personagem, ao lado do produtor Tomoyuki Tanaka, do especialista em efeitos especiais Eiji Tsuburaya e do compositor Akira Ifukube (o célebre som emitido pelo personagem), uma criação que se revelou acertada, tendo neste primeiro filme uma obra de ficção científica kaiju capaz de transmitir paradigmaticamente a ameaça nuclear, ao mesmo tempo que coloca o Japão perante a ameaça de um monstro destruidor que viria a marcar a história do cinema.
 Logo no início do filme somos transportados para o interior de um conjunto de estranhos acontecimentos que conduzem ao aparecimento de um raio no interior da escuridão, que culmina com a destruição de um navio de pesca e à posterior devastação do navio que veio procurar averiguar o que aconteceu à primeira embarcação. Um ancião cedo avisa os moradores do causador desta destruição ser Godzilla, um monstro que se esconde nas profundezas do mar e que outrora fora alimentado por jovens raparigas servidas como sacrifício para saciar a sua fome por morte e destruição. Como é óbvio, inicialmente poucos ligam ao que este senhor de certa idade diz, mas a verdade é que ele até diz umas coisitas acertadas e o monstro é mesmo o gigante de cinquenta metros de altura e cordas vocais afinadas que "apenas" tem como intenção rebentar tudo aquilo que vê à frente. Quando Godzilla surge, escusado será dizer que a destruição acontece em doses generosas, algo que leva ao paleontologista Kyohei Yamane (Takashi Shimura) sair de Tóquio e decidir observar os acontecimentos ocorridos na ilha de Odo, deparando-se com algumas provas que evidenciam as origens pré-históricas da criatura (a trilobite), que se encontram nas pegadas gigantes, que comprovam não só as origens de Godzilla mas também a influência radioactiva para o despertar da mesma, algo que gera o pânico geral no público presente nessa reunião. Entre as discussões sobre a necessidade de esconder ou revelar a existência do monstro e o triângulo amoroso protagonizado por Emiko Yamane (Momoko Kōchi), Hideto Ogata (Akira Takarada) e o Dr. Daisuke Serizawa (Akihiko Hirata), acabamos por descobrir que este último inventou o "Destruidor de Oxigénio", uma arma que promete ser capaz de destruir o monstro, mas caindo nas mãos erradas pode provocar o caos entre os seres humanos. Enquanto os personagens procuram tomar medidas (e alguns resolver as suas vidas amorosas), o monstro regressa e ataca Tóquio, prometendo causar uma onda de destruição à altura da grande dose de entretenimento que "Godzilla" proporciona ao espectador, ou seja, enorme.
 Acção, destruição em massa, pânico colectivo, histeria, "Godzilla" revela-se uma obra cinematográfica que continua relevante nos dias de hoje, juntando ao valor de entretenimento uma boa realização, uma história simples mas capaz de prender o espectador, surgindo como um importante documento representativo do receio que existia em relação à tecnologia nuclear (a capacidade da radiação poder produzir monstros) na época em que o filme foi elaborado. Esse receio surge representado não só no monstro (a ameaça que vem de fora que se prepara para destruir o território japonês), mas no próprio discurso dos personagens, temerosos pela possibilidade de poderem surgir mais monstros devido à possível proliferação das armas químicas (e a subsequente radiação), com a ciência a surgir muitas das vezes como uma perigosa arma no caso de poder cair nas mãos erradas (veja-se o caso do Dr. Serizawa que procura proteger a fórmula da sua invenção a todo o custo, evitando que a sua invenção tenho o mesmo destino da criação de J. Robert Oppenheimer). Diga-se que a temática dos monstros ou das criaturas geneticamente alteradas devido à radiação proliferaram durante a década de 50, assistindo-se a filmes como "The Beast From 20,000 Fathoms" (1953), "Them!" (1954), "Tarantula" (1955), entre outros, mas poucos tiveram a aderência criada por "Godzilla".
 "Godzilla" não só iniciou uma franquia em torno do monstro, mas também popularizou o kaiju, um género que surge associado aos filmes de ficção científica japoneses que envolvem criaturas gigantes, tais como Gamera, Rodan, Mothra, King Ghidorah, Mechagodzilla, curiosamente todos estes produzidos pela Toho Company Ltd., um estúdio japonês conhecido pela produção e distribuição de vários kaiku, mas também pela distribuição/produção de filmes de Akira Kurosawa, distribuição de filmes dos estúdios Ghibli, entre outros. Com uma popularidade capaz de rivalizar com o seu poder de destruição, Godzilla surge no primeiro filme da saga como uma criatura destruidora e animalesca que ameaça tudo e todos, sendo notável o sentido de timing de Ishirō Honda ao saber criar os momentos de tensão para o aparecimento do monstro, ao criar todo um universo narrativo que embora seja bastante simples consegue gerar o interesse do espectador em volta dos personagens e adensar o pânico pelo aparecimento do monstro. A este aparecimento de Godzilla em doses cirúrgicas não deve ser alheio o facto dos efeitos especiais não serem os melhores, mesmo para a época. Ao invés da técnica de stop-motion, de filmes como "The Lost World" (1925) e "King Kong" (1933), "Godzilla" conta com um homem no interior de um fato (no caso Haruo Nakajima), que anda por um cenário construído à escala para ser destruído, ou seja, temos um homem a partir um conjunto de "brinquedos gigantes", algo que dá um tom bastante datado aos efeitos do filme, sobretudo se comparados com muitos filmes de ficção científica contemporâneos.
 Com alguns efeitos algo datados em relação aos filmes de ficção-científica contemporâneos, "Godzilla" concentra as suas atenções no clima de medo e paranoia em relação a Godzilla, à ameaça nuclear, ao mesmo tempo que aborda questões ligadas com o clima de insegurança no Japão e desenvolve um triângulo amoroso entre Emiko Yamane (Momoko Kōchi), Hideto Ogata (Akira Takarada) e o Dr. Daisuke Serizawa (Akihiko Hirata). Se a história resulta relativamente bem em relação ao pânico gerado por Godzilla e à necessidade de travar o monstro, o mesmo não se pode dizer do triângulo amoroso que parece surgir apenas para estender a narrativa e incutir alguma densidade emocional extra que raramente se adequa ao clima da narrativa, apesar dos bons desempenhos dos elementos do elenco.
 Os elementos do elenco surgem com interpretações relativamente coesas, sobressaindo Takashi Shimura e Akihiko Hirata como dois indivíduos que são forçados a lidarem com situações éticas algo complicadas devido ao aparecimento de Godzilla. O primeiro interpreta um arqueólogo cuja curiosidade em relação ao monstro supera a sua vontade de o destruir. O segundo interpreta um cientista cuja invenção não só pode permitir a destruição de Godzilla, mas também da humanidade. Dois personagens mais complexos do que inicialmente poderiam parecer, numa história simples que tem como especial elemento de interesse o monstro Godzilla, um ser que gerou uma enorme aderência por parte do público, tornando-se num ícone da história do cinema.
 Sem uma personalidade propriamente dita, Godzilla surge no primeiro filme como um monstro que apenas pretende destruir tudo à sua volta, colocando a cidade de Tóquio e o Japão em alvoroço perante esta ameaça vinda das profundezas do mar, uma ameaça que simboliza o clima de desconfiança em relação às armas atómicas. Gigante (cerca de cinquenta metros de altura), inquieto, mortal, Godzilla gera o pânico em tudo e todos aqueles que dele se aproximam com o seu rugido inconfundível e a radiação destruidora que emite da sua boca, uma imagem de marca que atravessa vários dos filmes da franquia, embora mais tarde o monstro venha a ganhar uma faceta mais heróica. "Godzilla" está longe de ter os efeitos especiais mais aprumados ou a história mais complexa, mas continua a manter um inestimável valor de entretenimento e significado numa obra cinematográfica icónica que teve o condão de lançar uma saga e um personagem conhecido um pouco por todo o Mundo.  

Título original: “Gojira”.
Título em inglês: “Godzilla”
Realizador: Ishirō Honda
Argumento: Ishirō Honda, Takeo Murata, Shigeru Kayama.
Elenco: Akira Tarada, Momoko Kôchi, Akihiko Hirata, Takashi Shimura, Sachiro Sakai, Ren Yamamoto, Kan Hayashi.

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